Considerada um predador do topo da cadeia, a onça-pintada reina absoluta nos ambientes onde vive, alimentando-se de pequenos tatus e cutias a jacarés e antas.
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A onça-pintada (Panthera onca) é o maior felino das Américas, o terceiro maior felino do mundo, atrás apenas do tigre (Panthera tigris) e do leão (Panthera leo). É conhecida por diversos nomes nas diferentes regiões onde ocorre: onça-preta, jaguar, jaguaretê, yaguareté, tigre, canguçu, pintada, pinima, pinima-malha-larga e pixuna.
Considerada um predador do topo da cadeia, a onça-pintada reina absoluta nos ambientes onde vive, alimentando-se de pequenos tatus e cutias a jacarés e antas. Elas controlam populações de presas e são de extrema importância no equilíbrio dos ecossistemas onde estão inseridas. São carnívoras estritas, ou seja, alimentam-se exclusivamente de carne. Levando em consideração a proporção, têm a mordida mais poderosa entre os felinos, inclusive mais forte que a do tigre e a do leão.
É um animal com hábitos predominantemente crepusculares e noturnos, sendo mais ativo ao anoitecer e ao amanhecer, embora não seja raro encontrá-lo se deslocando e caçando durante a luz do dia. Sua área de vida varia muito, de acordo com o ambiente, a disponibilidade de presas e a densidade populacional de onças.
Curiosidades
Clique nas imagens abaixo para conhecer um pouco mais sobre a Onça-Pintada.
Habitat
Originalmente, a onça-pintada ocorria desde o sudoeste dos Estados Unidos até a região central da Argentina. Hoje, ocorre desde o México até o norte da Argentina. Está presente em quase todo o Brasil, que possui a maior população de onças-pintadas do mundo, sendo o principal país na conservação e sobrevivência da espécie em longo prazo.
As onças se adaptam a diversos tipos de ecossistemas. Podem ocorrem em áreas de floresta fechada, campos abertos ou regiões áridas e semidesérticas, apesar de preferirem áreas úmidas, com corpos d’água. No Brasil, ocorrem em quase todos os biomas, exceto no Pampa, onde já estão extintas.
No Pantanal e na Amazônia, as suas populações são maiores e mais estáveis, devido à menor taxa de ocupação humana e às maiores áreas preservadas. No Cerrado, a população é menor, mas ainda existe em números consideráveis. Já na Caatinga e na Mata Atlântica, existe em números muito pequenos, correndo sérios risco de extinção local.
As áreas de vida das onças podem variar muito de Norte a Sul do país devido a alguns fatores, como disponibilidade de presas, fontes de água, densidade populacional de outras onças e características do bioma.
A diferença de tamanho de habitat pode aparecer até entre animais vizinhos, por isso não é possível definir uma média geral para as onças. As áreas podem variar entre 30 km², no Pantanal, e 1.300 km², no Cerrado. As menores áreas são no Pantanal, provavelmente por causa da alta disponibilidade de comida. As maiores são no Cerrado e na Mata Atlântica, possivelmente devido à maior dificuldade de se encontrar alimento e outros recursos, como parceiros reprodutivos. Machos ocupam territórios em média três vezes maiores que os territórios de fêmeas.
Outro fator que pode interferir na área de vida são as crias. Fêmeas com filhotes ainda pequenos têm, geralmente, sua área de vida reduzida. Isso ocorre porque a mãe anda distâncias menores, uma vez que os filhotes não conseguem acompanhá-la em seu ritmo normal.
Características
A onça-pintada é um grande felino, pertencente à família Felidae. Pertence ao gênero Panthera, mesmo gênero dos leões, leopardos, tigres e leopardos-das-neves.
Tem uma coloração amarelo-dourada e pintas nas cabeças, patas e pescoço. No resto do corpo, possui rosetas com pintas no interior (uma das características que as distinguem dos leopardos), conferindo um alto grau de camuflagem quando está no interior da mata. O padrão de pintas é único para cada animal, ou seja, cada onça possui uma malha diferente de rosetas, funcionando como uma espécie de “impressão digital”. Isso nos ajuda a identificar cada indivíduo e melhor estudá-lo.
São animais grandes e musculosos, seu peso e tamanho podem variar de acordo com o ambiente. Em média, pesam entre 65 e 100 kg, porém machos com mais de 148 kg já foram registrados no Pantanal. Onças-pintadas do Pantanal são maiores e mais robustas que onças de outros biomas, devido, provavelmente, à maior disponibilidade de presas no bioma e à vegetação mais aberta. Em biomas como a Mata Atlântica e Amazônia, os indivíduos são menores e mais esguios, permitindo-os transitar mais facilmente por dentre a mata fechada.
Seu comprimento, do focinho até a ponta da cauda, pode chegar a 2,5 metros e 85 cm de cernelha (altura da pata dianteira até a escápula).
Assim como nos outros felinos do gênero Panthera (leão, leopardo, tigre e leopardo-das-neves), o osso hióide da onça-pintada, localizado na região da garganta, não é completamente ossificado, permitindo que este grupo de animais emita sons mais graves. O mais famoso deles é o rugido do leão, que pode ser ouvido a mais de 5 km de distância. Nas onças-pintadas, esse som é conhecido como esturro.
Melanismo
A ocorrência de onças pretas é relativamente frequente. O melanismo é causado por uma mutação em um gene específico, uma alteração genética que resulta no acréscimo da melanina, uma das proteínas responsáveis pela pigmentação, o que torna a pelagem do animal mais escura. O melanismo não é exclusivo das onças-pintadas, sendo registrado em 13 espécies de felinos ao redor do mundo.
Onças-pretas são a mesma espécie da onça-pintada comum, o que difere é essa pelagem mais escura. Quando se observa de perto e havendo a luminosidade, é possível ver as rosetas em sua pelagem, o padrão comum entre as onças. Há registros de onças-pretas na Amazônia, na Caatinga, no Cerrado e na Mata Atlântica. No Pantanal, a ocorrência de indivíduos melânicos ainda não foi comprovada. Alguns pesquisadores acreditam que a ausência de melanismo no bioma se deve a fatores como umidade, temperatura, precipitação e, principalmente, radiação solar.
Comportamento
As onças-pintadas, em geral, são animais com hábitos crepusculares e noturnos, são mais ativas ao anoitecer e amanhecer. Seu pico de atividade, normalmente, é no fim da tarde/ começo da noite, porém continuam ativas durante grande parte da madrugada, até o alvorecer. Isso não quer dizer que elas são inativas durante o dia. Dependendo do local e do tipo de presa que estão caçando, elas podem caçar durante o dia com tranquilidade.
Por muito tempo acreditou-se que as onças-pintadas eram animais totalmente solitários, que não toleravam a presença de outras onças em seu território. Ao longo dos anos, descobrimos que as fêmeas são mais tolerantes com outras fêmeas em seus territórios. Já registramos sete onças dividindo a mesma carcaça, algo que até então era considerado muito improvável. Especula-se que, quando o recurso alimentar é muito grande, a tolerância entre os indivíduos aumenta. Sendo assim, compensa mais compartilhar o alimento do que correr o risco de se ferir gravemente ou mesmo morrer em uma briga.
Uma das formas pelas quais as onças se comunicam é por meio da vocalização. O esturro é utilizado de diferentes formas, em diferentes tons, para se comunicar com outras onças, podendo servir para chamar filhotes, para espantar competidores ou para atrair machos (no caso de fêmeas no cio).
Por serem animais territorialistas, onças marcam suas áreas com fezes, urina, marcações no chão feitas com as patas (“scrapes”), esfregando partes do corpo para deixar o cheiro e arranhões em árvores (apesar de os arranhões também serem utilizados para afiar as garras). Também costumam se esfregar em objetos, tais como árvores, arbustos e rochas, deixando muitas informações olfativas, como, por exemplo, a receptividade das fêmeas para o acasalamento. As vocalizações são também formas bem importantes de comunicação entre os indivíduos, cada uma contendo uma série de informações distintas que rege as complexas interações sociais da espécie.
Alimentação
Onças são estritamente carnívoras, alimentando-se apenas de carne. Por serem animais que estão no topo de sua cadeia alimentar, mais de 80 espécies podem fazer parte de seu cardápio. A onça é capaz de predar praticamente qualquer animal terrestre ou semiaquático em seu ecossistema. Elas se alimentam de animais de menor porte, como tatus, peixes, quatis e macacos, apesar de terem preferência por animais de médio e grande porte, como veados, jacarés, capivaras e até antas.
Em ambientes mais alterados pelo homem e com menor disponibilidade de presas naturais (queixadas, antas, capivaras, jacarés), as onças podem acabar predando animais de criação, como o gado, de modo a gerar um conflito com fazendeiros. Por isso, elas são mortas, como forma de retaliação ou de “prevenção” aos ataques às criações domésticas.
As onças-pintadas possuem uma técnica distinta dos outros felinos para abater suas presas. Diferente dos outros felinos que mordem o pescoço, sufocando a presa, as onças geralmente mordem o animal na base do crânio, na parte de trás do pescoço. Porém, também podem abatê-lo mordendo o focinho. Além disso, elas são capazes de perseguir e caçar as suas presas na terra, na água e em árvores.
Gestação
Segundo a literatura, onças-pintadas atingem a maturidade sexual por volta dos 2 anos. Nossa equipe já registrou fêmeas acasalando com cerca de 15 meses de idade. Normalmente, os machos se unem às fêmeas apenas na época reprodutiva, podendo passar dias juntos. Nossa equipe tem registrado um tempo médio de permanência entre casais de 4 a 5 dias, período em que não caçam, alimentando-se somente quando encontram alguma carcaça, às vezes abatida por outra onça. Nesse período, brigas entre machos podem acontecer e a fêmea pode trocar de parceiro. As cópulas são rápidas, duram apenas segundos, por isso se repetem diversas vezes ao longo do dia, sendo mais intensas e frequentes nas horas de temperaturas mais amenas (do entardecer ao amanhecer).
Não existe um período reprodutivo delimitado, as onças podem se acasalar durante o ano todo. A cópula é um tanto agressiva. Os machos possuem espículas em seu pênis, o que facilita a fixação do órgão no canal vaginal da fêmea. Porém, essas espículas podem machucá-la durante o ato. Durante a cópula, o macho morde a parte de trás do pescoço da fêmea, o que ajuda a estimular a ovulação. As vocalizações durante as cortes e cópulas também soam agressivas para quem ouve, mas todo esse conjunto de comportamentos e estímulos faz parte do repertório natural de acasalamento da espécie.
O tempo de gestação varia entre 93 e 105 dias, podendo gerar entre um e quatro filhotes. Ao longo dos anos de monitoramento em campo, nossa equipe registrou uma frequência maior de um a dois filhotes por ninhada. A mãe cuida sozinha das crias, sem nenhuma ajuda do macho. Os filhotes permanecem com a mãe até atingirem por volta de 2 anos de idade, às vezes menos, quando começam a desgarrar-se e procurar seu próprio território. Este período é essencial para o filhote, pois ele aprende com a mãe a caçar, defender-se e interagir com o meio. Algumas fêmeas se estabelecem dentro da área de vida da mãe, sendo mais facilmente toleradas por ela do que as fêmeas sem parentesco. Já os machos, em geral, dispersam-se para novas áreas, longe do local onde nasceram. Eles dificilmente retornam à área natal, o que diminui as chances de acasalamentos consanguíneos.
Conservação
Apesar de já ter sido extinta em diversos lugares onde ocorria, o Brasil abriga cerca de 50% das populações de onça ainda existentes. A Amazônia, atualmente, é o maior refúgio para onças ao longo de sua distribuição, seguida pelo Pantanal. Porém, em biomas como a Mata Atlântica e a Caatinga, a espécie corre grave risco de extinção.
Por ser um predador do topo da cadeia, a onça-pintada precisa de um ambiente saudável e equilibrado para existir. Ela ajuda no controle de populações e são importantíssimas no ecossistema em que estão inseridas, gerando um impacto positivo em escala de paisagem. Porém, as populações de onças vêm diminuindo ao longo das décadas, devido a diferentes fatores, entre eles a perda de habitat, a caça e, mais recentemente, a demanda da China por ossos, dentes e outras partes da espécie utilizados na medicina tradicional chinesa.
Onças-pintadas sofrem ameaça de extinção e são consideradas como “vulneráveis” (VU) de acordo com o Livro Vermelho da Fauna Brasileira Ameaçada de Extinção (ICMBio, 2018). Já de acordo com a União Internacional para Conservação da Natureza (IUCN, 2018), são consideradas como “quase ameaçadas” (NT).
Apesar do status geral ser de vulnerabilidade, a conservação varia de acordo com o bioma:
Amazônia: “Quase ameaçada”
Devido ao tamanho da floresta ainda protegida e à disponibilidade de recursos, a Amazônia continua a abrigar a maior população de onças do mundo. Mesmo assim, o ritmo acelerado de desmatamento no bioma e a caça ameaçam as populações locais.
Pantanal: “Quase ameaçada”
O Pantanal é o bioma que foi menos alterado pelo homem ao longo dos anos. Isso contribui para a situação menos preocupante lá do que em outros biomas. É onde existem as maiores densidades de onças do mundo, graças à alta disponibilidade de comida. A principal ameaça no bioma é a caça por retaliação à predação de gado.
Mata Atlântica: “Criticamente ameaçada”
Estima-se que existam menos de 300 indivíduos de onça-pintada em toda a extensão de Mata Atlântica remanescente. Esse número é tão baixo que ainda que a caça e o desmatamento parassem de imediato, essas populações já estão condenadas à extinção nos próximos 90 anos.
Cerrado: “Em perigo”
As populações de onça-pintada neste bioma reduziram em mais de 50% nos últimos 25 anos, principalmente devido ao avanço agropecuário em áreas de mata nativa. Essas populações estão em um estado melhor do que as da Mata Atlântica e Caatinga, porém correm sérios riscos ao longo do tempo.
Caatinga: “Criticamente ameaçada”
Assim como na Mata Atlântica, a situação das onças da Caatinga também é muito crítica. Pesquisadores estimam que existam menos de 300 onças em todo o bioma. Pouco se conhece sobre as onças deste bioma, o que torna mais difícil as ações para a sua conservação.
Pampa: “Extinta”
Relata-se que as onças ocorriam em grandes densidades no Pampa. Mas a conversão do habitat natural, associada com a intensa perseguição direta para caça, levou ao completo desaparecimento da espécie no bioma. Acredita-se que a última onça-pintada do Pampa foi morta por caçadores em 1952. O que aconteceu neste bioma pode se repetir em grande parte da área de ocorrência da espécie, pois as tendências populacionais indicam declínios severos, mostrando a urgência de ações imediatas para a sua conservação.
Ameaças
A fragmentação de habitats e a perda de áreas de floresta em razão da ação humana são as principais ameaças às onças-pintadas. Áreas desmatadas para a produção agropecuária e expansão de cidades diminuem as áreas de vida desses predadores, diminuindo também a disponibilidade de presas naturais.
A segunda principal ameaça a esses felinos é a caça. Antigamente, as onças eram mortas em especial para a retirada e venda de sua pele como item de decoração. Na década de 1960, cerca de 15 mil peles de onça-pintada eram exportadas por ano. Durante esse período as populações reduziram drasticamente. Apesar de hoje a comercialização de peles ser proibida, as onças continuam sendo mortas por caçadores. Conforme fazendeiros alteram o ambiente para a criação de gado bovino ou de outros animais e caçam as espécies de presas silvestres, a disponibilidade de alimento diminui. O que resulta no aumento do contato entre onças e seres humanos e, eventualmente, na predação do gado, gerando um conflito de longa data entre pecuaristas e onças-pintadas.
Mais informações
Cultura
As onças-pintadas fazem parte da cultura dos povos nativos das Américas há milênios.
Referências para a seção sobre a onça-pintada:
Plano Nacional de Conservação da Onça-pintada:
http://www.icmbio.gov.br/portal/images/stories/docs-plano-de-acao/pan-onca-pintada/livro-onca-pintada.pdf
Livro: Panthera onca – à sombra das florestas, de Adriano Gambarini, Laís Duarte, Mario Haberfeld e Rogério Cunha de Paula
Livro: A onça pintada na cultura pantaneira, de Adriano Gambarini, Laís Duarte e Mario Haberfeld
Galeria de imagens
foto: Edu Fragoso