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Turistas observam onça-pintada junto com a equipe do Onçafari – Foto: Edu Fragoso

*Por Fábio Paschoal

A onça-pintada ocorria em todos os biomas brasileiros, mas hoje está extinta nos Pampas, e é classificada como criticamente em perigo na Caatinga e na Mata Atlântica, em perigo no Cerrado e vulnerável no Pantanal e na Amazônia. Nos biomas em que ela se encontra mais ameaçada, a perda e fragmentação de habitat leva ao isolamento das populações. Além disso, fazendeiros abatem os felinos para proteger seus rebanhos e, após décadas de perseguição e caça, a onça se tornou um dos animais mais difíceis de avistar na natureza.

Para mudar essa história, Mario Haberfeld fundou o Onçafari em 2011 no Pantanal, a maior área alagável do mundo, com duas estações bem definidas: cheia e seca. Esse ciclo das águas impediu a agricultura, conservou a biodiversidade e, segundo a ONG SOS Pantanal, 86% da vegetação nativa permanece na área. No entanto, 90% da terra pertence à propriedade privada e a pecuária é a principal atividade (e também a maior ameaça às onças).

Isa, uma das onças-pintadas reintroduzidas no Pantanal pelo Onçafari Rewild – Foto: Edu Fragoso

Segundo Mario, a ideia é fazer com que as onças se habituem a carros de safári para que possam se comportar da mesma maneira que os felinos selvagens africanos, que ficam confortáveis em torno dos veículos. O objetivo é atrair mais turistas, aumentar o interesse dos fazendeiros em observação de animais, gerar novas oportunidades de trabalho para a população local, ajudar na conservação do felino e, consequentemente, do Pantanal. “É necessário fazer as onças-pintadas – e toda a fauna e flora que coexistem com elas no mesmo habitat – mais valiosas vivas do que mortas”, afirma.

Uma técnica utilizada com leopardos e leões na África do Sul há 30 anos está sendo adaptada para a onça-pintada no Pantanal. Um animal selecionado é seguido por um rastreador, dia após dia, até que ele pare de considerar o carro como uma ameaça. O ideal é escolher uma fêmea. Quando ela tiver filhotes vai ensinar tudo para os pequenos. Assim, a habituação aos veículos será passada para a próxima geração. O processo não envolve métodos de domesticação (como o oferecimento de comida) e os felinos selecionados permanecem selvagens.

Fera, irmã de Isa (também foi reintroduzida no Pantanal pelo Onçafari Rewild) sendo observada por turistas do Refúgio Ecológico Caiman – Foto: Edu Fragoso

Mario trouxe rastreadores da South Africa’s Tracker Academy (Academia de Rastreadores da África do Sul), com a missão de treinar a equipe do projeto na arte de rastrear a vida selvagem para facilitar o encontro com o felino. Conhecer e perceber o ambiente – e o comportamento e as características dos sinais do animal que será seu alvo – é fundamental. As onças se movem em campos de gramíneas e densas florestas com solo coberto por folhas secas, locais onde a formação de pegadas é difícil. O rastreador pode perder o seu caminho. Para encontrá-lo novamente, é preciso analisar a localização, interpretar os sinais e colocar-se na posição do animal que está sendo rastreado.

Todo o processo é realizado no Refúgio Ecológico Caiman (REC), do empresário Roberto Klabin (fundador e presidente da SOS Mata Atlântica e da SOS Pantanal). Câmeras foram instaladas nas árvores para identificar as onças que habitam a fazenda e algumas fêmeas foram capturadas para a instalação de colares com GPS que mapeiam a área de cada indivíduo. Os animais selecionados para a habituação têm o território dentro do REC. Essa é uma condição essencial, já que a caça – apesar de ilegal – ainda acontece no Pantanal. Fazer a habituação de um felino que pode entrar em outras fazendas seria um risco para o animal. Ele poderia se aproximar dos caçadores e seria um alvo fácil. Tudo está sendo acompanhado pelo ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade) e pelo Cenap (Centro Nacional de Pesquisa e Conservação de Mamíferos e Carnívoros).

Esperança, uma das onças monitoradas pelo Onçafari – Foto: Adam Bannister

Quando você tem uma equipe no campo, que estuda continuamente a vida das onças-pintadas e constrói um relacionamento com elas – dando-lhes nomes e tornando-se cada vez mais especializada em encontrá-las – as possibilidades são enormes. Isso pode levar o ecoturismo no Pantanal ao mesmo nível da África em termos de safáris, gerar empregos melhores e mais qualificados para a população local e abrir oportunidades para as mulheres, que não têm espaço na criação de gado. Também pode gerar interesse na criação de áreas protegidas para todos os tipos de espécies dentro de fazendas e tornar a observação de vida selvagem uma atividade lucrativa que pode ser conciliada com a pecuária extensiva.

No Refúgio Ecológico Caiman isso já é uma realidade. O número de encontros com onças-pintadas passou de 138 no ano de 2013, para 696 em 2017, houve um crescimento de 7 para 88% nos avistamentos do felino por turistas no hotel (durante a estação seca, o número vai para 95,5%). Isso elevou a ocupação em 120%, aumentando exponencialmente a necessidade de contratação de pessoas locais para trabalhar e, em sete anos, o Onçafari tornou-se autossustentável através de ecoturismo e doações. Mas isso não é suficiente para Mario. Agora ele quer replicar todo o processo de habituação em outras partes do Brasil.

O Onçafari é um projeto sem fins lucrativos. Para fazer uma doação e ajudar a preservar o Pantanal e a onça-pintada acesse https://oncafari.org/ajude.html

*Fábio Paschoal é biólogo, jornalista, guia de ecoturismo e produtor de conteúdo da GreenBond e do Onçafari

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